Cabeça de papel: o quartel pegou fogo, a polícia deu sinal, mas o Mourão não ajudou a apagar o incêndio porque não era a função dele.| Foto: Angélica Rodrigues.
Porto Velho, RO - Achei mesmo que o general Mourão, ops!, desculpe, senador Mourão andava meio sumido. Logo ele, que foi eleito pelos gaúchos agora flagelados por uma enchente que, olha, nunca vi nada igual. Mas antes o ex-vice-presidente de Bolsonaro tivesse ficado aquartelado, em silêncio e com medo da leptospirose mesmo. Porque, assim que resolveu abrir a boca, Mourão deu uma declaração que conseguiu a proeza de ser ainda pior do que aquela da “democracia pujante”. Lembra?
Em entrevista à Rádio Gaúcha, Mourão foi cobrado por sua ausência no estado que o elegeu senador. Nem que fosse para enfrentar politicamente o interventor ilegítimo Paulo Pimenta ou para ajudar as Forças Armadas – cuja imagem está na lama, como disse alguém, e não para de afundar. Forças Armadas que chegaram a ordenar a evacuação de um bairro por causa do rompimento de uma barragem que não aconteceu. Sim, teve isso.
Em vez de dar uma satisfação minimamente digna ao seu eleitorado, porém, Mourão disse algo que já seria inadmissível para um homem comum saudável, que até outro dia gostava de esbanjar saúde e vitalidade se deixando flagrar andando de bicicleta ou correndo, mas que é ainda mais inadmissível num senador eleito apenas e tão-somente pelo título de general. Isto é, um senador que de certa forma representa essa instituição que um dia foi sinônimo de sacrifício: o Exército.
Mourão respondeu que, veja bem, já tenho 70 anos, não se vê homens de 70 anos no meio da água, blábláblá. E se tivesse ficado apenas com essa desculpa rota e andrajosa, tudo bem. Mas aí Mourão resolveu mostrar toda a exuberância da sua covardia de burocrata-de-coturno e disse: “Não vejo isso [ajudar no socorro às vítimas da enchente] como a minha função. Seria um desvio de função”.
Caravaggio, Mourão!
Ao ouvir essa declaração repugnante do senador idem, tive que parar e inspirar e expirar e inspirar e expirar até que os palavrões abrissem caminho para uma pergunta mais ponderada. Ou ao menos tão ponderada quanto possível: qual, então, é a sua função, senador? É ficar batendo papo no cafezinho do senado? É ficar polindo as medalhas que o senhor recebeu por méritos abstratos? É ficar consultando o extrato para ver se o soldo caiu na conta? Caravaggio, Mourão!
E eu sei que muita gente está cansada de ler isso, mas vou me permitir ser repetitivo para dizer que o mal grita e o bem sussurra. Digo, geralmente é assim, mas não hoje. Porque, como contraponto à desculpa abjeta do senador, faço questão de registrar aqui a história de Adroaldo Gabana, de 39 anos. Ele era agrônomo e sua função, obviamente, não era salvar vidas na enchente. Mas, ao ver seus semelhantes em dificuldades, Gabana não foi covarde como uns e outros. E isso, infelizmente, lhe custou a vida.
Gabana viajou de Ciríaco para Muçum, uma das cidades mais afetadas pela enchente, e onde o general Antônio Hamilton Martins Mourão recebeu 1.555 votos na corrida ao Senado. Em meio às operações de resgate, porém, o agrônomo, que também era jogador de futsal, caiu de um caminhão, bateu a cabeça. Ele passou 18 dias internado. Seus órgãos foram doados pela família.
Fosse um político inútil e parasita, Gabana poderia ter dado qualquer desculpa para não ajudar as vítimas da enchente. Poderia ter dito, inclusive, que essa não era sua função. Ou que preferia jogar videogame ou então que tinha medo de pegar leptospirose ou sei lá mais o quê. Mas não. Adroaldo Gabana fez o certo. E morreu dando a vida para ajudar o outro. Que é como morrem os verdadeiros heróis.
Fonte: Por Paulo Polzonoff Jr.
Em entrevista à Rádio Gaúcha, Mourão foi cobrado por sua ausência no estado que o elegeu senador. Nem que fosse para enfrentar politicamente o interventor ilegítimo Paulo Pimenta ou para ajudar as Forças Armadas – cuja imagem está na lama, como disse alguém, e não para de afundar. Forças Armadas que chegaram a ordenar a evacuação de um bairro por causa do rompimento de uma barragem que não aconteceu. Sim, teve isso.
Em vez de dar uma satisfação minimamente digna ao seu eleitorado, porém, Mourão disse algo que já seria inadmissível para um homem comum saudável, que até outro dia gostava de esbanjar saúde e vitalidade se deixando flagrar andando de bicicleta ou correndo, mas que é ainda mais inadmissível num senador eleito apenas e tão-somente pelo título de general. Isto é, um senador que de certa forma representa essa instituição que um dia foi sinônimo de sacrifício: o Exército.
Mourão respondeu que, veja bem, já tenho 70 anos, não se vê homens de 70 anos no meio da água, blábláblá. E se tivesse ficado apenas com essa desculpa rota e andrajosa, tudo bem. Mas aí Mourão resolveu mostrar toda a exuberância da sua covardia de burocrata-de-coturno e disse: “Não vejo isso [ajudar no socorro às vítimas da enchente] como a minha função. Seria um desvio de função”.
Caravaggio, Mourão!
Ao ouvir essa declaração repugnante do senador idem, tive que parar e inspirar e expirar e inspirar e expirar até que os palavrões abrissem caminho para uma pergunta mais ponderada. Ou ao menos tão ponderada quanto possível: qual, então, é a sua função, senador? É ficar batendo papo no cafezinho do senado? É ficar polindo as medalhas que o senhor recebeu por méritos abstratos? É ficar consultando o extrato para ver se o soldo caiu na conta? Caravaggio, Mourão!
E eu sei que muita gente está cansada de ler isso, mas vou me permitir ser repetitivo para dizer que o mal grita e o bem sussurra. Digo, geralmente é assim, mas não hoje. Porque, como contraponto à desculpa abjeta do senador, faço questão de registrar aqui a história de Adroaldo Gabana, de 39 anos. Ele era agrônomo e sua função, obviamente, não era salvar vidas na enchente. Mas, ao ver seus semelhantes em dificuldades, Gabana não foi covarde como uns e outros. E isso, infelizmente, lhe custou a vida.
Gabana viajou de Ciríaco para Muçum, uma das cidades mais afetadas pela enchente, e onde o general Antônio Hamilton Martins Mourão recebeu 1.555 votos na corrida ao Senado. Em meio às operações de resgate, porém, o agrônomo, que também era jogador de futsal, caiu de um caminhão, bateu a cabeça. Ele passou 18 dias internado. Seus órgãos foram doados pela família.
Fosse um político inútil e parasita, Gabana poderia ter dado qualquer desculpa para não ajudar as vítimas da enchente. Poderia ter dito, inclusive, que essa não era sua função. Ou que preferia jogar videogame ou então que tinha medo de pegar leptospirose ou sei lá mais o quê. Mas não. Adroaldo Gabana fez o certo. E morreu dando a vida para ajudar o outro. Que é como morrem os verdadeiros heróis.
Fonte: Por Paulo Polzonoff Jr.
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