Tentativa do governo de politizar apagão adia soluções e alimenta desconfianças sobre setor elétrico

Tentativa do governo de politizar apagão adia soluções e alimenta desconfianças sobre setor elétrico


Ministro de Minas e Energia, Alexandre Silveira, aproveitou o apagão de 25 estados e do Distrito Federal para fazer política eleitoral.| Foto: Tauan Alencar/MME.

Porto Velho, RO - A incapacidade em explicar o apagão nacional da terça-feira (15), mais de um dia depois do ocorrido, e a opção por se defender com discurso eleitoreiro, tentando associar o colapso energético a medidas da gestão anterior, poderão custar caro ao terceiro mandato de Luiz Inácio Lula da Silva (PT). Especialistas do setor elétrico mostram espanto com os desdobramentos do episódio cujo diagnóstico segue às escuras. A oposição, por sua vez, renova as críticas à falta de rigor técnico do governo. Em paralelo, desconfianças de agentes econômicos e da população com serviços de infraestrutura tendem a crescer e se refletir negativamente sobre os índices de popularidade de Lula.

Ao longo das últimas três décadas, todos os governos têm sofrido forte desgaste com sinais de insegurança no fornecimento de eletricidade aos lares e às empresas, quase sempre repercutindo nas urnas. Ao saber do apagão, que ocorria quando ainda estava no Paraguai, o presidente Lula preferiu manter o silêncio e mandou de volta o ministro de Minas e Energia, Alexandre Silveira. Incumbido de acompanhar a resposta à crise que atingiu 25 estados e o Distrito Federal, deixando 30 milhões de brasileiros sem fornecimento durante três horas, o ministro mostrou-se desinformado e ainda insinuou como causas a privatização da Eletrobras e até mesmo uma sabotagem de opositores.

Sem explicações concretas, avançam as especulações

Em meio às incertezas sobre a aprovação de matérias econômicas importantes, como a reforma tributária e o arcabouço fiscal, o apagão emite novo sinal preocupante para o mercado. O governo terá de acompanhar como operadores financeiros reagirão às informações que ainda serão prestadas sobre a crise.

Sem apresentar explicações sobre o que exatamente ocorreu e quais foram as causas, a postagem em redes sociais da primeira-dama Janja Lula da Silva e a entrevista coletiva dada pelo ministro Silveira usaram do apagão para defender a reestatização da Eletrobras, tema caro ao presidente da República, mas que não conta com o apoio do Congresso.

O deputado Joaquim Passarinho (PL-PA), primeiro-vice-presidente da Comissão de Minas e Energia da Câmara, cobrou explicação concreta para o apagão. “Quando não se tem a informação segura, todas as especulações podem ocorrer”, disse ele nesta quarta-feira (16) em entrevista à rádio Novabrasil FM. O parlamentar criticou também “a politização de assunto tão sério”, tanto pelo governo quanto pela oposição. O ministro Silveira, que mandou a Polícia Federal e a Agência Brasileira de Inteligência (Abin) investigar o apagão, tem seu cargo alvo da disputa de parlamentares do Centrão.

Sob a gestão de Lula, o país também enfrentou um apagão bem mais grave em 2009, resultado de falha no sistema da binacional Itaipu. Uma súbita queda na demanda de energia levou ao desligamento automático de 20 turbinas na usina, afetando 90 milhões de pessoas. O incidente impactou integralmente quatro estados e deixou 90% do Paraguai às escuras.

Já no governo de Dilma Rousseff, onde a construção da hidrelétrica de Belo Monte (PA) era prioritária, uma falha numa subestação na divisa entre Pernambuco e Bahia resultou em blecaute que privou de luz 47 milhões de pessoas em 3 de fevereiro de 2011. O corte de energia durou várias horas em todo o Nordeste.

Reajustes da Petrobras sinalizam equívocos na política energética

Analistas avaliam a hipótese até de o apagão de 2023 ter servido de cortina de fumaça para o reajuste expressivo dos combustíveis ocorrido no mesmo dia, sobretudo o diesel, colocando em dúvida a política intervencionista de preços da Petrobras. A impressão mais forte é a de esforço do governo em recolocar a pauta de reversão da privatização da Eletrobras.

Outra probabilidade consistentemente aventada é de ter havido negligência e conflitos entre autoridades do setor energético, que esperavam ainda o aval de Lula e ou do ministro de Minas e Energia para saber como deveriam proceder. Só Roraima escapou do corte generalizado de eletricidade, por estar fora do Sistema Interligado Nacional (SIN).

Maurício Corrêa, do canal Paranoá Energia, critica o discurso do ministro Alexandre Silveira, acusando-o de agir de maneira política ao abordar o apagão. Corrêa aponta razões pelas quais considera que Silveira agiu inadequadamente. Primeiro, ele destaca que o Operador Nacional do Sistema (ONS) ainda não havia determinado a causa precisa do apagão. Depois, argumenta que seria mais apropriado deixar o ONS liderar o processo de investigação. Por fim, o especialista alega que, como político, o ministro estava sujeito a cometer erros, o que se concretizou quando fez declarações imprecisas.

Corrêa aponta a declaração de Silveira em que associa o apagão à privatização da Eletrobras como "sem qualquer fundamento". Ele sugere que talvez o ministro estivesse tentando agradar a pessoas próximas a Lula. Além disso, critica a insinuação de motivações políticas no episódio e o pedido para que órgãos policiais do governo conduzam investigações.

“São ações graves e demagógicas. Diante de um apagão, o caminho adequado é buscar as causas reais, aprimorar processos para evitar recorrências e resolver o problema de maneira técnica, sem manipulação da opinião pública. O momento é de governar com competência e evitar o uso político de situações que são essencialmente técnicas e não relacionadas à política ou à polícia”, afirmou.

Para Eduardo Galvão, professor de relações governamentais e políticas públicas do Ibmec-DF, a ameaça de apagões de energia sempre gera um desafio crítico durante o mandato de qualquer presidente.

“Gerenciar a infraestrutura elétrica, investir em fontes sustentáveis e modernizar a rede são imperativos para evitar impactos negativos na economia e até mesmo manter a estabilidade política”, disse.

Ele lembra que durante o mandato de Fernando Henrique Cardoso (PSDB), a falta de investimentos adequados deixou o Brasil vulnerável a apagões. “A crise de energia no início dos anos 2000 destacou a importância de abordagem preventiva e proativa na modernização e expansão do setor. O insucesso em antecipar essas necessidades contribuiu para o insucesso do ex-presidente em fazer o seu sucessor. Apagões de energia já provaram seu poder de deixar mandatos no escuro”, sublinhou.


Fonte: Por Sílvio Ribas

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